O filme Materialists poderia ser classificado como uma comédia romântica, mas em nenhum momento fica claro se é realmente esse o caminho trilhado pela roteirista e diretora Celine Song, conhecida por Vidas Passadas, de 2022. A sensação é de que Song não tem pressa — ou talvez nem intenção — de encerrar a história com personagens apaixonados e promessas de “felizes para sempre”. Comparada a ela, Jane Austen parece quase sentimental demais. Isso mesmo com todos os elementos tradicionais do gênero presentes: uma mulher solteira — que, neste caso, é uma casamenteira profissional — e dois pretendentes charmosos, interpretados por Dakota Johnson, Pedro Pascal e Chris Evans.
Mas Materialists não é exatamente sobre encontrar o “homem ideal”. É mais sobre evitar o “homem errado”. Essa inversão já coloca o filme em um campo mais ousado do que as comédias românticas convencionais. O próprio título — que remete a dinheiro, consumo e superficialidade — carrega um tom frio e crítico, quase como se fosse uma sátira marxista da série And Just Like That….
Isso não é uma crítica negativa. Pelo contrário. Materialists é uma experiência que prende — intrigante, mas sem ser confusa, e deliciosamente leve no seu humor sutil.
O tom lúdico se estabelece logo na cena inicial: um momento fantasioso e excêntrico. Em um cenário que lembra uma sociedade primitiva, como a dos primatas no começo de 2001: Uma Odisseia no Espaço, um jovem desajeitado, mas gentil, corteja uma jovem igualmente singela à porta da caverna de sua família. Esse casal pré-histórico reaparece ao final, fechando a narrativa em um ciclo simbólico.
No decorrer da história, acompanhamos Lucy (Johnson), uma casamenteira sofisticada e solteira, que construiu uma carreira de sucesso atendendo uma clientela abastada. Diferente do casal da caverna, seus clientes precisam de mais do que flores para selar compromissos. Lucy sabe vender a ideia de amor eterno — ela descreve o parceiro ideal como “alguém para dividir o túmulo” — enquanto avalia, com precisão, o valor social, financeiro e emocional de cada possível combinação.
Essas análises, claro, não são compartilhadas com seus clientes. Elas se desenrolam em algum ponto indefinido entre sua razão e sua emoção.
Lucy não é cínica. Mas, como diria Joni Mitchell, ela já viu a vida de todos os ângulos — e está longe de acreditar em contos de fadas. Ela reencontra John (Chris Evans), um ex-namorado que ainda luta para se firmar como ator aos 39 anos, sobrevivendo com trabalhos de garçom. Eles se veem novamente em um casamento: ela está vestida de azul diáfano, da cor do centro de uma chama de vela; ele entrega sua bebida e lembra que ela gosta de misturar cerveja com refrigerante. Ela, por sua vez, lembra das brigas constantes e da falta de dinheiro que marcavam o relacionamento.
Hoje, Lucy está financeiramente confortável e não pretende abrir mão disso. Não é possível julgá-la por isso, especialmente porque Dakota Johnson interpreta a personagem com um ar de melancolia resignada — ela parece sorrir por falta de uma alternativa melhor ao choro. E Materialists entende que o desejo por uma vida estável e luxuosa é um tipo legítimo de aspiração.
Talvez isso não inspire grandes emoções, e o casal da caverna provavelmente ficaria horrorizado com o que se tornou o conceito de casamento moderno. Mas qualquer pessoa que já morou em Manhattan conhece bem esse desejo por conforto e status. É uma tentação urbana antiga, que corrompe almas desde os tempos em que William Makepeace Thackeray escreveu, com ironia, o capítulo 36 de Feira das Vaidades: “Como viver bem com nada por ano”.
Materialists, ao que tudo indica, entrega uma comédia romântica que prefere a inteligência ao encantamento fácil — e pode muito bem ser o projeto ideal para Dakota Johnson mostrar toda a sua sofisticação cênica.